O abraço de Deus — Testemunho em vida, palavra, ação e sinal

Valdir Steuernagel

O mundo é cheio de cantos e recantos diferentes e belos. Em meu trabalho com a Visão Mundial, tenho oportunidade de andar por lugares de costumes diversos, comidas típicas e línguas muitas vezes únicas. A geografia é peculiar e as pessoas, singulares. Uns são altos e outros, baixos; uns são expansivos e outros, quietos; uns são claros e outros, escuros… Cada um tem sua peculiaridade, sua beleza e seu jeito de ser gente, ser família e viver em comunidade. A diversidade do nosso mundo é fantástica e profundamente enriquecedora.

Quanto mais ando por aí, mais percebo que somos iguais e carregamos a marca da nossa humanidade criada por Deus e à imagem dele. Atuamos em lugares da América Latina, Ásia, África, Oceania e Oriente Médio, sempre com crianças, no contexto de suas famílias e comunidades. Aí é que se percebe o quanto somos simultaneamente diferentes e iguais. Todo pai quer o bem dos filhos. Toda mãe quer filhos sadios e bem alimentados. Toda comunidade, se real, quer que os filhos se enturmem, brinquem juntos, sejam protegidos e cresçam em conhecimento e graça.

Embora a pobreza seja um fenômeno complexo, as questões são simples e básicas. A criança tem uma família que lhe dê sentido de espaço, acolhimento e proteção? Há sobre a mesa comida suficiente para que ela cresça saudável? A comunidade provê, para todas as crianças, um espaço de aprendizado escolar e um espaço para brincadeiras e o exercício da vida comunitária? Há lugar na sociedade para que a criança cresça e exerça o seu dom, trabalhe para sua sobrevivência, constitua família e exerça a cidadania? A espiritualidade vivida é saudável?

Tais observações podem parecer simples. A verdade, no entanto, é que responder a cada uma delas em particular e considerá-las em conjunto é complexo e difícil — como atesta a realidade. O mundo está cheio de crianças abandonadas, desnutridas e doentes. Crianças sem escola que deixam a escola cedo e caem no abandono da rua. Quantas comunidades desencontradas e cheias de conflitos gerados pelo consumo e tráfico da drogas, exploração econômica, luta de poder, violência e conflitos religiosos que dividem e separam as comunidades e as próprias crianças!

A nota humana do evangelho

Uma das marcas mais profundas, significativas e belas do evangelho é que ele detecta essa difícil realidade com sensibilidade e vai ao seu encontro com graça, compaixão e sentido de resgate. Quantas situações doloridas, carentes e desencontradas são manifestas nos Evangelhos! Basta Jesus chegar a um lugar ou decidir passar ao “outro lado do lago” para que uma multidão se forme; e ele próprio faz uma leitura dessa realidade: são “como ovelhas sem pastor”. Pessoas soltas, sozinhas, machucadas, oprimidas e doentes. E com elas Jesus passa boa parte do seu tempo, orientando-as, libertando-as, restaurando-as. Na linguagem bíblica, ele lhes leva o “shalom” — a bonita, completa e integrada salvação que só Deus pode produzir.

Nesta seção, temos revisitado o chamado dos discípulos, reafirmando a nossa vocação para a relação com Deus (chamados para estar com Jesus), para pregar o evangelho (testemunhar sobre a palavra que dá sentido à vida), curar os enfermos (afirmar a restauração que Deus opera em nossa vida) e expulsar os demônios (anunciando uma libertação que só Deus pode proporcionar e que restaura a nossa humanidade).

Quanto mais procuro vivenciar e entender essa vocação, mais me surpreende o quanto Deus vem ao nosso encontro nas áreas mais essenciais e carentes da vida: “significado, pertencimento, saúde, liberdade e comunidade”. É que Deus — que é um Deus de amor e, consequentemente, de salvação — não nos traz aquilo de que não precisamos, mas vem ao nosso encontro nas áreas mais necessitadas da existência humana e comunitária.

Hoje falamos em “missão integral” como um esforço por seguir o modelo de presença e intervenção de Jesus sem separar o testemunho cristão em pedaços que, juntos, não formem o quadro da profunda e completa restauração humana que Deus dá. Não somos chamados a separar o que Deus juntou; e o que ele juntou se vê na própria criação do ser humano à sua imagem. Assim, nosso testemunho começa e termina com a nossa própria vida. Ele passa pelo desenvolvimento de uma relação que aponte para a intimidade com Deus e se estenda para o anúncio de um evangelho que dá significado à vida e esperança para o futuro. Porém, ele acontece também pela intervenção restauradora e curadora na sociedade e na experiência de uma libertação que só Deus proporciona. Nosso testemunho se dá por meio da vida, do anúncio da Palavra, da experiência da cura restauradora e do sinal da libertação que ocorre no nome de Jesus. O testemunho se dá no seguimento a Jesus, que diz ao paralítico: “Levante-se! Pegue a sua maca e ande”, mas também adverte: “Olhe, você está curado. Não volte a pecar, para que algo pior não lhe aconteça” (Jo 5.8, 14).

• Valdir Steuernagel é pastor luterano e trabalha com a Visão Mundial Internacional e com o Centro de Pastoral e Missão, em Curitiba, PR. É autor de, entre outros, Para Falar das Flores… e Outras Crônicas.

 

Ultimatoonline Setembro-Outubro 2010 edição 326  Ultimato.com.br

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