A política do filho único na China

Hoje vou falar sobre um assunto que está muito presente em minha vida e vi que muitos brasileiros tem curiosidade sobre isso, que é a POLÍTICA de FILHO ÚNICO na CHINA. Muita gente me pergunta: “Sisi, você é filha única?”, “Você tem irmãos?”. Então, hoje vou te responder com a minha própria experiência. Além de falar sobre minha experiência pessoal, vou falar alguns dados importantes sobre a POLÍTICA de FILHO ÚNICO na CHINA, como quando começou, quais consequências trouxe para a sociedade, quais pontos negativos e positivos e muito mais! Se você tem curiosidade para saber mais sobre a cultura chinesa e aprender e conhecer mais sobre a China, esse vídeo é para você!

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Quero falar hoje da política do filho único da China. Baseio a maior parte do meu post nas anotações que fiz durante a aula de Yun Zhou, professora de Sociologia na Universidade de Peking. Ela deu a melhor aula de todas!
Como vocês sabem, passei 21 dias na China graças ao Programa Top China, patrocinado pelo Santander, que levou 76 alunos e 24 professores de universidades brasileiras a Pequim e Shanghai
A China tem hoje 1,4 bilhão de pessoas, a maior população do mundo. 

Alunos brasileiros posam com crianças chinesas no campus da PKU, Pequim

 
 

19% de todo o planeta é chinês. Só pra traduzir: uma em cada cinco pessoas da Terra é chinesa. Ou seja, é uma multidão de gente. Mas a Índia provavelmente ultrapassará a China como país mais populoso do mundo em 2025. 

Até agora, só aconteceram seis censos na história da China: em 1953, 64, 82, 90, 2000 e 2010.  Há também alguns levantamentos mais simples, com 1% da população, o último em 2005. Quem é contado nos censos são as pessoas com residência permanente. Em 1953, havia 600 milhões de chineses. Em 64, 823 milhões. Em 82, 1,030 bi.

A política do único filho foi implantada em 1979. Antes de passar a lei, o governo começou a tentar mudar o conceito de quantos filhos seria o certo. Um era considerado pouco; três, demais. Dois seria o ideal.

A política foi iniciada porque o governo estava preocupado com os efeitos da superpopulação no meio ambiente e nos serviços públicos, como saúde e educação. Hoje calcula-se que, sem a lei, a China (e, vale lembrar, o mundo) teria mais 400 milhões de pessoas, ou seja, dois Brasis a mais.

(Só um adendo, para quem ainda acha que no Brasil os pobres têm muitos filhos. Não é mais assim. Em 1960 a brasileira tinha em média 6 filhos. Em 1980, já eram 4. Em 2000, 2. Hoje uma brasileira tem 1,9 filho, e a estimativa é que, até 2020, a média caia para 1,5, que é basicamente a taxa de reposição da população).

 
 
 
O problema de ter poucos filhos é o mesmo em todo lugar: a população vai envelhecendo, há menos força produtiva, e o sistema de previdência fica sobrecarregado. Hoje quase 9% da população chinesa tem mais de 65 anos (os homens se aposentam aos 60, e as mulheres, aos 55). A baixa taxa de fecundidade é na realidade um quadro geral em todo o leste asiático.
Em 1984, o governo chinês permitiu 1,5 filho em áreas rurais: se a primeira criança fosse uma menina, o casal poderia ter uma segunda chance e tentar ter um menino. Eu ouço essas coisas e dá vontade de chorar. Mas as pessoas com quem falei sobre aborto, infanticídio e abandono de meninas na China se fizeram de egípcias, ou melhor, de chinesas. Todo mundo fala como se isso tivesse acontecido em regiões muito distantes, como algo do passado. Mas o fato é que há 30 milhões a mais de chineses que chinesas no país.
Meu lindo amigo Vitor (seu nome ocidental) pontuou que ainda é forte o costume de que a família do noivo deve providenciar uma casa para o novo casal. À família da noiva, cabe entrar com a mobília e decoração da casa e talvez com um carro. Como o preço dos imóveis nas grandes cidades chinesas é proibitivo, muita gente está preferindo ter uma filha, segundo Vitor.
O governo considera que planejamento familiar é uma política nacional básica. Todo cidadão tem o direito de se reproduzir, mas também a obrigação de controlar sua fertilidade. Quando um casal se casa, recebe instruções e um kit contraceptivo. Faz uma espécie de entrevista, em que responde quando planeja ter o filho.
A professora contou que, no auge do controle governamental, a mulher poderia ser punida se tivesse mais de um filho. Se insistisse em ter o segundo filho, perderia o emprego, por exemplo. Perguntaram pra professora o que acontecia se a mulher grávida do segundo filho não trabalhasse -– como ela seria punida? A professora demorou pra entender a pergunta: “Todas trabalham”, ela respondeu.
Hoje há incentivos financeiros, em vez de punições, para quem só tem um filho. Mas existe uma taxa de “compensação social” que deve ser paga por quem tem mais de um filho. Paga-se duas vezes a renda familiar anual naquela área.
No final de 2013, o governo chinês relaxou a política do filho único. Se o primeiro filho tiver algum tipo de deficiência, o casal pode ter outro. Mineiros e pescadores podem ter um segundo filho. Casais em segundo casamento também podem ter um filho, mesmo que já tenham outro do casamento anterior.
Minorias étnicas não têm restrições. Se marido ou mulher são filhos únicos, podem ter dois filhos. Na realidade, parece que há 22 exceções. E, como disse a professora, se o casal quiser mesmo um outro filho, sempre se dá um jeito.
Com o relaxamento da lei, 11 milhões de casais podem agora ter o segundo filho. Porém, somente pouco mais de um milhão se inscreveu. A razão para as pessoas não terem mais de uma criança hoje é o custo. Calcula-se que o custo de criar um filho em Beijing é de 2,76 milhões de yuans (cerca de 1,4 milhão de reais do nascimento até a maioridade). Glupt.
No final da palestra, perguntei à professora sobre a “síndrome do pequeno imperador”: seria verdade que toda essa geração de filhos únicos fosse mais mimada, e tivesse mais dificuldade de trabalhar em equipe? Ela disse que não há estudos conclusivos sobre isso.

Vitor mês passado na Grande Muralha

 
Falando com Vitor, ele filho único e super amável, vi que ele se sentiu solitário por não ter irmãos na infância. Eu quis saber o porquê, já que tantos de seus amigos também eram filhos únicos. Ele respondeu que eles não ficavam juntos o tempo todo.
É verdade, mas pelo jeito ele passaria um tempão longe dos irmãos do mesmo jeito, se os tivesse.
Até os dois ou três anos de idade, Vitor morou com os avós, não com os pais, já que os pais precisavam trabalhar e ele não tinha idade para entrar no maternal. Depois, já em idade escolar, passava o dia todo no colégio. Aos 15 anos, os melhores alunos das escolas de sua província receberam o convite para estudar numa escola de primeira linha. Vitor foi morar longe da família, dividindo dormitório com os colegas.
Agora, aos 19, está numa das melhores universidades do país, e continua dividindo dormitório com três colegas (eles não podem escolher com quem dividir). A viagem de Beijing para sua casa no oeste da China leva 40 horas de trem (5 de avião). Ele está lá agora, durante as férias na faculdade, sendo mimado pela mãe, que havia prometido por telefone fazer todas as comidas que ele gosta. Mas Vitor me confidenciou que ela não é muito boa cozinheira.
Mais sobre a política do filho único.
 
 
Escreva Lola Escreva
 
Sou professora da UFC, doutora em Literatura em Língua Inglesa pela UFSC e, na definição de um troll, ingrata com o patriarcado. Neste bloguinho não acadêmico falo de feminismo, cinema, literatura, política, mídia, bichinhos de estimação, maridão, combate a preconceitos, chocolate, e o que mais me der na telha. Apareça sempre e sinta-se em casa. Meu email: lolaescreva@gmail.com. Meu Twitter também é movimentado. Agora tenho um canal no YT, o Fala Lola Fala. Te vejo lá também
 

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