Caminhando com Deus no deserto

Deus sempre faz os seus filhos caminharem com Ele no deserto. Antes de Jesus nascer, o Senhor levou José e Maria a fazerem uma jornada até a terra natal de José, onde nasceu o Salvador. Após o nascimento da criança, quando era ainda um bebezinho, Deus encaminhou a bendita família para um longa viagem, atravessando o deserto, até o Egito. Nesse tempo, o precursor do Messias ainda crescia, e se robustecia em espírito, mas há um ponto interessante: João Batista esteve nos desertos até ao dia em que havia de mostrar-se a Israel (Lc 1.80). A necessidade da caminhada pelo deserto parece ser um requisito para conhecer melhor a Deus. Aos 30 anos, depois do batismo em águas, o Espírito conduziu (*) Jesus para outra jornada: seriam quarenta dias pelo deserto. Ali Ele foi provado e aprovado; no fim, os anjos o serviram. O Senhor Jesus desenvolveu seu ministério caminhando com seus discípulos, ora nos desertos, nas montanhas ou em alto mar, o Espírito Santo sempre fazia com que Jesus e seus discípulos se movimentassem frequentemente. Após ressuscitar, Jesus se encontra com Pedro, às margens do Mar de Tiberíades, e, mais uma vez, disse-lhe: “Segue-me” (Jo 21.19). Pedro sai da beira do fogo e caminha com Jesus. Simplesmente caminha. Não há palavras. Caminhar, caminhar, caminhar! Nenhuma revelação ou milagre. O dia a dia não é tão cheio de emoções e milagres. O milagre está em não parar de caminhar. Seguir em frente. Pedro, porém, perde a razão e questiona acerca de um boato sobre João, mas o terno Jesus simplesmente repete a orientação: “Segue-me, tu! Portanto, mantenha o foco em mim, pois nesta caminhada você aprenderá coisas muito caras”. A última caminhada com Jesus é marcada pelo silêncio. Há mais silêncio do que palavras. Jesus quer que: Pedro, caminhe… Em breve nós nos encontraremos, outra vez, além do mar. Findos os quarenta dias depois da ressurreição, mas antes de subir ao céu, Jesus disse que os crentes receberiam o poder do Espírito Santo e, logo em seguida, mencionou que o interesse dEle era que os discípulos continuassem caminhando, saindo desde Jerusalém e indo até aos confins da terra. Desde então, vinte séculos de cristianismo são passados e, ao longo desses milênios, quando a igreja estava em comunhão com Deus, ela sempre se movimentou, caminhou, levando o evangelho a todo o mundo, ao mesmo tempo em que se aprofundava no conhecimento do caráter de Deus. A história do povo de Deus no livro de Números, igualmente, está sempre em movimento. O pano de fundo é uma promessa feita há séculos a um velho chamado Abraão e confirmada a seus descendentes Isaque e Jacó, bem como a toda a sua linhagem. Chegado o tempo oportuno, Deus, por intermédio de Moisés, libertou os israelitas da escravidão e, após a travessia do mar, guiou-os pelo deserto, rumo à Terra Prometida. Entretanto, primeiro, era necessário passarem pelo Sinai, para que recebessem a lei, pois precisavam de parâmetros civis, morais e espirituais, para se estabelecerem como nação. As pessoas que se aventurariam com o Altíssimo nessa longa estrada deveriam manter um alto padrão de santidade, conforme anunciado no Sinai e explicado diversas vezes ao longo do trajeto. Infelizmente, eles viram os feitos do Senhor, mas não quiseram conhecer os seus caminhos (Sl 103.7) e, por isso, após quase quarenta anos de caminhada pelo deserto, toda aquela geração adulta de ex-escravos hebreus morreu e não alcançou a promessa. Entretanto, diferentemente de outros povos, os hebreus não sucumbiram — Deus queria preservá-los para si, pois havia prometido que, deles, descenderia o Salvador do mundo. O livro de Números narrará a caminhada das duas gerações de hebreus pós-escravidão egípcia, uma que morreu no deserto e outra que seguiu com Deus o plano até chegar à fronteira da Terra Prometida.

(*)Alterei o verbo original do texto (…convidou a segui-lo para outra jornada…) ao comparar o texto original da Bíblia da Liderança Cristã.     

Deus viu o sofrimento do Seu povo no Egito e, cumprindo as promessas feitas aos patriarcas, oportunizou-lhes que escrevessem, com suas vidas, uma linda história para a glória do Senhor. Assim, o Eterno, logo após os “atrair” com os sinais realizados por intermédio de Moisés e Arão no Egito, “levou-os ao deserto” para lhes “falar ao coração”; de fato, no deserto do Sinai, Deus lhes entregou a lei! Ocorre que, como eles desprezaram a comunhão, o Altíssimo, por amor, fê-los peregrinar quarenta anos por um grande e terrível deserto de serpentes ardentes, e de escorpiões, e de terra seca, em que não havia água (Dt 8:15) – algo que marcou indelevelmente a vida deles, para que, no final, uma nova geração de hebreus possuísse a “terra do amorreu”.        

Como o povo de Israel, também, nós do século XXI, na nossa trajetória existencial, não passamos incólumes pelo deserto da vida. Observe-se que o Senhor, por quarenta anos, guiou-os por ambientes completamente inóspitos, mas sempre dava-lhes mantimento, conforto, proteção… e requeria deles (como requer da Igreja) apenas que vivessem em santidade e tivessem uma atitude de confiança quanto ao futuro. Não é assim, porventura, conosco? No deserto expõem-se as resistências, quebra-se o orgulho, promove-se a obediência, mede-se as forças, demonstra-se o caráter, prova-se a fé, e, por fim, um forte facho de esperança se acende perenemente no coração. O ambiente de provação, dessa forma, oferece oportunidades riquíssimas de aperfeiçoamento espiritual e crescimento pessoal.        

A maior parte dessa caminhada dos hebreus com Deus, pelo deserto, foi registrada no livro de Números, o qual retrata, de forma, empolgante e diversificada, os altos e baixos do relacionamento entre o povo de Israel com o Criador, o qual promove claramente um eficiente treinamento estratégico, testando os limites espirituais, emocionais e morais dos Seus servos em um tempo de escassez de recursos, o que não é incomum entre nós. Jesus, por exemplo, disse que não tinha onde reclinar a cabeça e Paulo afirmou que sabia passar necessidade, porque ele podia todas as coisas nAquele que o fortalecia. Assim, para todo cristão, em algum momento da trajetória da vida, haverá períodos de dificuldades, por isso é preciso ter muito cuidado para não sucumbir nestes dias difíceis.        

O treinamento em “terra seca e árida” apresenta-se insubstituível, pois deixará aprendizados indeléveis, indispensáveis para se seguir com fé e confiança somente em Deus, pois, além da escassez, surgem as fofocas, as vãs suspeitas, as acusações, os julgamentos sumários sem provas, as decepções com pessoas queridas! Os liderados de Moisés, por exemplo, suscitaram dúvidas acerca de sua autoridade espiritual, seu bom senso, sua idoneidade moral e de sua integridade. Aliás, essa desconfiança de Moisés se propagou, inclusive para além do acampamento, pois até os vizinhos edomitas (nação co-irmã) desconfiavam de suas reais intenções.        

É de sabença curial que, em alguns momentos, deparamo-nos com situações de sofrimentos inesperados, mas no deserto isso se multiplica sensivelmente. Não é raro que, em face das necessidades e falta de apoio dos amigos, surjam conflitos existenciais os mais diversos, corroborados pela abundância de murmurações, bem como pela recorrência de medos e desapontamentos. Moisés enfrentou esses dilemas. Certa vez ele orou assim: “Eu só não posso levar a todo este povo, porque muito pesado é para mim” (Nm 11:14). Tais circunstâncias não aconteceram só com ele, — todos nós, que também temos os nossos desertos, nalguns instantes, pensamos em abandonar a missão recebida, por entender que a carga pesada demais.

Viver no deserto não é fácil, pois além de tudo isso, eventualmente ainda ocorrem grandes tragédias, como aconteceu com Moisés em Números 20, quando narra-se a morte de Miriã e Arão, seus irmãos e, também a reprovação por Deus, o qual não lhe permitiu que entrasse na terra prometida.

Mesmo com tantas lutas, ao analisar tudo, chega-se à conclusão, com alívio, que não há o que temer quando se está em comunhão com o Senhor, ainda que a provação seja terrível, a não ser o pecado, pois esse sim pode destruir completamente uma vida, como se vê na trajetória de Balaão, o qual ficou “para exemplo aos que vivessem impiamente” (2ªPe 2:6).

A geração que atravessou o mar vermelho a pé enxuto havia sido totalmente consumida durante a peregrinação, entretanto, nenhum deles faleceu por falta do cuidado de Deus, mas por causa da desobediência; tentaram a Deus e cairam no deserto (Hb 3:16,17).

No fim dos quarenta anos, o Senhor já havia levantado novos hebreus para concluírem a jornada e, nessa hora crepuscular, defronte a Canaã, às margens do Jordão, o Altíssimo ofereceu-lhes uma visão extraordinária sobre o futuro. Eles tinham direito a uma herança pela fé. Deus fez com que avistassem a terra prometida, ouvissem os ecos e percebessem os cheiros daquele lugar que manava leite e mel. O tempo do deserto estava terminando, embora ainda existisse a perspectiva de muitos conflitos bélicos depois do Jordão, mas aqueles instantes ali eram de profunda paz e consolo; no fim de tudo, eles podiam crer, a conquista seria completa e absoluta.

Sabendo que tudo estava chegando ao final, Moisés fez um registro das peregrinações – das jornadas do Egito até as campinas de Moabe – a fim de analisar os progressos, as quedas, os aprendizados, propiciados ao longo da travessia. Aquela nova geração deveria absorver, ao máximo, os conselhos de Deus, razão pela qual, após os acontecimentos do livro de Números, Moisés repetiu longamente tudo o que Deus falou – o livro de Deuteronômio e, só então, passou pelos portais da eternidade, no Monte Nebo. O rio Jordão estava cheio, transbordando pelas suas ribanceiras, mas não haveria problema quanto a esse fato. Deus cumpriria brevemente o que prometeu: Josué entraria, depois de atravessar o rio, com a nova geração na herança de Deus.

O livro de Números, ao narrar a caminhada dos hebreus, com seus altos e baixos, constrói um protótipo extraordinário da experiência de fé de cada servo de Deus em todos os tempos, podendo, pelos detalhes exuberantes, ser considerado “O Peregrino” (de John Bunyan) do Antigo Testamento. A vida do povo de Deus é mesmo assim: primeiro caminha-se por muitas estradas perigosas, quando nos deparamos frequentemente com personagens e situações inusitadas, mas tudo isso tem um propósito: o aprimoramento espiritual e conhecimento mais íntimo do caráter de Deus para, depois, poder tomar posse das bençãos que estão preparadas para aqueles que o amam.

“Portanto, agora vou atraí-la; vou levá-la para o deserto e vou falar-lhe com carinho” (Os 2:14).

“Eu mesmo os tirei do Egito, e os conduzi por quarenta anos no deserto para lhes dar a terra dos amorreus.” (Am 2:10).

O PAPEL DO DESERTO (Lc 4:1_13)

O papel do deserto na preparação de um líder não pode ser superenfatizado. Ambos, Mateus e Lucas, registram o período em que Jesus passou no deserto antes de iniciar seu ministério. Jesus ficou quarenta dias sozinho no deserto, abstêmio de comida, da agitação de pessoas e de distrações. Ambos os evangelistas escrevem que esse foi um tempo determinado pelo Espírito Santo. Mas o que é que acontece com os líderes? Durante esse período de solidão.

Lucas nos dá “dicas”:

1 – Nós reconhecemos que Deus nos conduz para períodos de crescimento, não de gratificações;

2 – Nós temos grandes batalhas e vencemos as tentações de querer tomar atalhos;

3 – Nós aprendemos disciplina e a arte de depender de Deus;

4 – Nossa auto-suficiência e autopromoção são destruídos;

5 – Nós solidificamos o sentido de nossa missão;

6 – Nós ganhamos perspectiva;

7 – Nós somos preparados para assumir nossa vocação.

https://pesquisadorcristao.blogspot.com/2018/11/o-livro-de-numeros-caminhando-com-deus-no-Deserto.html

Revista Ensinador Cristão Ano 20 – nº77 – cpad.com.br

Artigo

Por Reynaldo Odilo

Bíblia da Liderança Cristã – SBB – Almeida RA

 

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