A nobreza dos bereanos

Por Rubem Amorese

Data-se de 1972 a entrada do Brasil na chamada “sociedade de consumo”. O marco, arbitrário, é o primeiro programa colorido de TV veiculado no país. Já tínhamos comerciais nos jornais e revistas, nas rádios e na televisão. Mas ainda não éramos, em rigor, uma sociedade de consumo. Ainda não se falava em consumismo nem, muito menos, em “fazer uma sessão de terapia no shopping”.

Foi com a transformação de nossa sociedade em “mercado” que passamos a gastar o que não temos para comprar o de que não precisamos. O crediário viabilizou a gratificação imediata, o prazer “terapêutico” de comprar “sem pensar no amanhã”. A ponto de relegar a cidadão de segunda categoria aquele que não tem dívidas ou cartão de crédito.

O fenômeno da pluralidade nos transformava em um grande supermercado. As opções de sabores, estilos, marcas e grifes abarrotaram as prateleiras culturais, competindo por nossas escolhas, cada vez mais íntimas, privadas – não criticáveis. Cada um elegia seus “produtos” (que podiam variar de um tipo de arroz a um estilo de cabelo ou jeito de viver). Como estavam todos nas prateleiras sociais, horizontalizavam-se, em termos de valores, uns em relação aos outros, de modo que uma opção não poderia julgar a outra; porque quem determina o que é melhor ou pior é o consumidor. Você decide.

Também as ofertas de “produtos religiosos” se pluralizaram, horizontalizaram e privatizaram. E fizeram de nós, igualmente, consumidores. Só não se imaginava o alcance desse fenômeno, a modificar nosso modo de pensar, porque não se tinha alcançado ainda o estado de “aldeia global”, no sentido trazido pela internet, que deu à luz as redes sociais. Essas redes começaram conectando pessoas e grupos ao redor do mundo. E quem estava longe pôde se aproximar. E os encontros e reencontros borbulharam aos milhões. Amizades perdidas no passado e pela distância foram reatadas. Mensagens fluíram e grupos se formaram.

Com a evolução da tecnologia, conteúdos passaram a ser veiculados por esses canais. A princípio, em forma de texto, mas logo a rede suportou áudio e vídeo. Surgiram, então, os clipes com todo tipo de mensagens, sem falar nas comunicações entre pessoas ou grupos, por áudio e vídeo, quase que a substituir os telefonemas. Também vieram os canais de TV on-line, com todo tipo de conteúdo, incluindo os religiosos. E os crentes, de todo credo, agora podiam escolher a igreja, o pregador e a mensagem a ouvir. E não somente aos domingos, mas a qualquer momento. O mundo na telinha do celular.

***Com o surgimento da pandemia do Coronavírus, as igrejas passaram a oferecer cultos e classes de escola bíblica on-line. Mas no seu coração o pastor se inquieta: o que estarão minhas ovelhas vendo e ouvindo? Serão as mesmas, quando tudo passar? Ou teremos, no salão de culto, uma nova igreja, agora mais parecida com uma salada de frutas doutrinária e comportamental?

Nada a fazer, querido pastor. É preciso confiar que o Espírito Santo lhes dará a nobreza dos bereanos, para conferir com as Escrituras o que ouvem por aí (At 17.11).

Rubem Amorese é presbítero na Igreja Presbiteriana do Planalto, em Brasília. Foi professor na Faculdade Teológica Batista por vinte anos e consultor legislativo no Senado Federal. É autor de, entre outros, Fábrica de Missionários e Ponto Final. Acompanhe seu blog pessoal.

https://www.ultimato.com.br/revista/artigos/390/a-nobreza-dos-bereanos

Uma resposta para A nobreza dos bereanos

  1. ***Hoje são 29-08-2021. Sou assinante da Revista Ultimato a muitos anos e quando li o artigo do Rubem Amorese, basicamente os textos que marquei com (***), itálico e em azul, lembrei-me imediatamente dos meus amados filhos e esposa. Poderia acrescentar também alguns parentes que tem nos acompanhado a mais de 20 a 30 anos. Sou um homem de oração além de exercer o magistério eclesiástico. E tenho pautado a minha vida pela retidão e com certeza quem me conhece um pouco sabe desta realidade. Mas desde 2006 uma série de situações aflitivas tenho passado ( https://saldaterraeeluzdomundo.wordpress.com/testemunho-de-conversao/) e grande parte dos meus dias tenho procurado priorizar a minha saúde e claro neste interim não consigo acompanhar todos como desejaria, porém ao ler este texto, basicamente [Nada a fazer, querido pastor (presbítero). É preciso confiar que o Espírito Santo lhes dará a nobreza dos bereanos, para conferir com as Escrituras o que ouvem por aí (At 17.11)], o mesmo veio como bálsamo e renovando esta confiança,

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