A secularização da Igreja – Entrevista com o Rev. Ageu Magalhães

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A secularização de uma sociedade pode ser entendida, em um sentido literal, como um processo pelo qual a religião deixa de ser o aspecto cultural agregador, transferindo para uma das outras atividades desta mesma sociedade este fator coercitivo e identificador. Ela faz com que tal objeto de análise já não esteja mais determinado diretamente pela religião.

A palavra secularização identifica um fenômeno histórico dos últimos séculos, pelo qual as crenças e instituições religiosas se converteram em doutrinas filosóficas e instituições levianas, além de identificar processos nos quais se verifica a transferência de bens da igreja a instituições seculares ou públicas. No nosso caso, estamos estudando a secularização que ocorre de forma menos dramática mas tão trágica quanto a exposta. A secularização que presenciamos hoje em dia é um processo lento, sutil e bem elaborado, sua atuação quase nunca é percebida pelo cristão distraído ou absorvido pela vida secular, na verdade muitas vezes lhe parece muito natural e inofensiva.

As coisas mundanas adentram o rebanho de Deus, o qual, se estiver se consagrando e se dedicando a seu Criador, logo a detectam e a eliminam de seu meio, mas caso contrário, é bem possível que sejam recebidas com folguedo e entusiasmo e até usadas como oferta ao Senhor, à moda de Saul (1ª Sm 15:19-20). Este processo demoníaco, no entanto, tem sido já há muito denunciado pela Palavra de Deus, que confirmada pelo Espírito Santo nos dons atribuídos à igreja, tem chamado o povo de Deus ao despertamento e à fuga do ócio venenoso que deixa-os sem tempo para orar, jejuar, interceder e comungar com os irmãos, mas com horas inteiras para gastar com outros mestres onde trabalha, estuda, ou na sala de sua casa diante de um aparelho de TV.

Para finalizar, vamos reforçar lembrando que o ser humano tem um alto poder de adaptação, ou seja, consegue se adaptar e aceitar as mais adversas situações desde que lhe seja dado o tempo necessário. Assim, vemos que muitas coisas, claramente profanas e até monstruosas como a aparência vermelha, de tridente e chifres às vezes atribuída ao adversário já não apavora a muitos por já estarem familiarizados com ela nos filmes de terror, nas piadas dos amigos de bar ou nos quadrinhos de bancas de jornais, demonstrando como a “máquina” pode ser silenciosa no funcionamento e ao mesmo tempo eficiente nos resultados. De forma semelhante, o mau quando administrado com cuidado, consegue se infiltrar na igreja usando este método, pois os cristãos vão se acostumando com sua aparência, a princípio inofensiva, e toleram-no, sem perceber sua discreta evolução e crescimento.

Segue abaixo, uma mensagem do Pr Hernandes Dias Lopes abordando um tema associado à secularização da Igreja. Excelente e obviamente complementa a mensagem do Rv Ageu Magalhães.

Bibliografia: Sites diversos

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Uma resposta para A secularização da Igreja – Entrevista com o Rev. Ageu Magalhães

  1. Ética cristã e secularismo

    Por Paul Freston

    Princípios bíblicos para lidar com o secularismo e a sociedade pluralista

    Há algumas décadas, o cristianismo era criticado por ser falso ou, pelo menos, altamente improvável. O alvo da crítica, portanto, eram as suas crenças e a sua “falta” de coerência intelectual. Hoje, o cristianismo é criticado por ser moralmente repreensível. O alvo da crítica, portanto, é a sua ética.

    O secularismo e o secular

    O secular é, em boa parte, uma ideia cristã, baseada no voluntarismo, na autonomia, na liberdade humana e na ideia de mandato cultural. Ao contrário do islã, as Escrituras cristãs (o Novo Testamento) não legaram uma “Lei Sharia”, mas falaram apenas de uma lei “escrita no coração”.

    O secularismo, por outro lado, é uma ideologia que procura não necessariamente combater a religião em si, mas a presença da religião na vida pública. Deseja excluir não somente o autoritarismo religioso, mas também a inspiração religiosa. Ele tende a retratar os religiosos como “fundamentalistas”, criando, assim, um espantalho.

    Os cristãos muitas vezes exageram a força do secularismo e o retratam como uma conspiração coordenada, interpretando tudo que acontece da forma mais sinistra, o que leva a algumas reações errôneas.

    Autovitimização

    A tendência à autovitimização e à autopiedade cria, na sociedade, a impressão de uma comunidade cristã paranoica, complexada ou facilmente manipulada.

    Devemos evitar o complexo de perseguido e a ideia de que “nunca houve uma época tão imoral quanto a nossa”. A realidade é que muita coisa melhorou nos últimos cinquenta anos, mesmo do ponto de vista da ética cristã.

    Querer defender o indefensável

    Às vezes os cristãos se colocam na posição de defender o indefensável, achando que é a única maneira de proteger a fé cristã. A história da igreja está repleta de exemplos de defender o intelectualmente indefensável ou o moralmente indefensável. Porém, um cristianismo que se valha disso não vale a pena.

    Insistir na religião como fundamento da moral

    Não é sábio insistir na ideia de que a religião seja o fundamento essencial da moralidade. A moralidade secular autônoma é perfeitamente possível. Claro, talvez haja uma origem religiosa para muitas ideias éticas seculares, mas isso não resolve a questão se, para a casa da moralidade, a religião é o alicerce ou apenas o andaime. Um alicerce é permanente e indispensável, ao passo que um andaime é temporário e, se conservado, enfeia a casa feita.

    Por isso, melhor do que enfatizar o passado (contribuição histórica) ou o presente (um suposto alicerce) é enfatizar o futuro: a fé cristã afirma que, afinal, o bem triunfará sobre o mal e todas as injustiças serão consertadas.

    Destempero verbal

    Um mundo encolhido pela globalização incentiva o uso de uma linguagem mais ponderada e respeitosa, mais sensível ao dano que pode causar, evitando os retratos caricatos e a ofensa desnecessária.

    Num mundo globalizado pela migração e pela internet, precisamos mais do que nunca da visão bíblica do uso responsável da língua, da igualdade humana e da universalidade do conceito de “próximo”.

    Miremo-nos no exemplo de Jesus: nada de destempero verbal contra os indefesos, vulneráveis ou marginalizados. Jesus “xingou” somente os poderosos de sua época, chamando-os de “raposas” e de “sepulcros caiados”. Quanto mais vulnerável o grupo ou pessoa, maior era o seu cuidado com a linguagem usada.

    Contrapor o cristianismo aos direitos humanos

    Alguns cristãos veem os direitos humanos como anticristãos e essencialmente secularistas. Ironicamente, alguns secularistas concordam, mas, na realidade, a fé cristã fez uma grande contribuição histórica ao desenvolvimento dos direitos humanos, tendo sido uma das principais maneiras com que o cristianismo operou contra a tendência de idolatrar o Estado – sem falar da imensa contribuição cristã à evolução do humanitarismo.

    A não discriminação, a aceitação do pluralismo cultural, os direitos humanos e o questionamento da desigualdade global não são ideias politicamente corretas promovidas pelo “humanismo secular”, como alguns cristãos pensam, mas já estavam presentes nos pensadores cristãos do mundo antigo. Como reagir, então?

    Distinguir entre o bebê e a água do banho

    Parte do problema são mudanças complexas no interior das igrejas nas últimas décadas. Precisamos ser capazes de conservar o bebê – a fé em si – e jogar fora a água suja do banho – os acréscimos doutrinais e morais questionáveis.

    Quem já viveu certo tempo na fé ou já teve a chance de conviver com cristãos de outros lugares perceberá com mais facilidade como certas posturas consideradas hoje como parte integral da fé não o foram no passado.

    Aceitar a normalidade de uma sociedade pluralista

    Os desafios éticos são perfeitamente normais na fé cristã, por pelo menos duas razões: primeiro, por causa do mandato cultural, a tarefa dada ao ser humano de desenvolver responsavelmente a vida em comum e o uso da natureza. Segundo, porque vivemos numa sociedade pluralista, e isso é normal.

    Há uma tendência, nas análises cristãs, de falar dos dias atuais como acentuadamente incertos e, portanto, excepcionalmente desafiadores para os cristãos, mas não devemos pensar assim.

    Lembrar que a ética cristã deve ser cristocêntrica

    O exemplo de Cristo é o caminho supremo para os cristãos em matéria de ética. E o exemplo de Cristo é marcado, acima de tudo, por duas características: a humildade e o amor. “Vista a semelhança de Cristo, ou seja, a humildade e o amor”, diz o grande místico cristão Walter Hilton. Dostóievski acrescenta: “A humildade cheia de amor é uma força tremenda, sem nenhuma outra igual”.

    Lembrar que a fé cristã se caracteriza pela encarnação

    Encarnação, o grande princípio cristão, implica em risco ético. Jesus foi muito criticado eticamente, em boa parte por ser tolerante demais e universalista demais.

    Pela natureza da revelação bíblica (histórica, encarnacionista e não legalista), as implicações éticas são cada vez mais percebidas ao longo do tempo. A revelação é a mesma, mas em algumas áreas a nossa compreensão das suas implicações éticas mudou.

    Textos bíblicos fundamentais

    Romanos 12.2
    Quando o apóstolo Paulo inicia a parte ética da sua carta magna, ele começa com a instrução de não sermos conformados à sociedade, mas transformados pela renovação do nosso entendimento. Sobressaem dois aspectos aqui: primeiro, vemos que o estado normal, mesmo do cristão, é a conformidade com os padrões sociais, seja com os padrões emergentes, seja com os padrões de uma geração atrás. Alguns cristãos se conformam com muita facilidade aos padrões emergentes; outros se conformam aos padrões antigos como se fossem bíblicos. Em segundo lugar, vemos que a renovação do entendimento é um processo constante, não algo que se faça de uma vez por todas.

    Mateus 7.12
    A chamada “regra de ouro” não se originou no cristianismo, mas Cristo tomou o que era um princípio negativo (“não façam aos outros…”) e o transformou em positivo, aumentando em muito o seu alcance transformador.

    Marcos 2.27
    A grande afirmação sobre o sábado se aplica a muitas outras instituições sociais. As possíveis aplicações são infinitas, porém citemos somente duas: assim como “o ser humano não foi feito para o sábado”, também “o ser humano não foi feito para o Estado” (a idolatria ao Estado) e, igualmente, “o ser humano não foi feito para o mercado” (a igualmente nociva idolatria ao mercado).

    Gálatas 3.28
    Coincidentemente ou não, Paulo escolhe, para ilustrar o seu princípio de que “em Cristo não há discriminações”, justamente as três categorias omitidas da democracia antiga, com base na discriminação étnica, social e de gênero.

    Gênesis 18.25
    O juiz de toda a terra certamente fará justiça. Todos os nossos juízos éticos a respeito dos outros se baseiam em informações parciais.

    Alguns princípios norteadores

    Em primeiro lugar, devemos manter as proporções bíblicas nas questões éticas. As questões mencionadas raramente na Bíblia devem ser mencionadas raramente por nós, não elevadas em pedras de toque da fé pura. Por outro lado, as questões éticas que aparecem em quase todas as páginas da Bíblia, como a avareza, o orgulho, a incapacidade de perdoar e a indiferença, devem ter primazia no nosso próprio esforço ético e naquilo que recomendamos aos outros, dentro e fora da igreja.

    Em segundo lugar, enfatizemos a liberdade cristã, que separa o cristianismo dos monoteísmos mais legalistas, dentro de dois critérios: o critério da consciência (como em Romanos 14.23, o que não provém da fé é pecado) e o critério do cuidado pastoral pelos fracos na fé (Rm 14; 1ªCo 8–10).

    Por fim, não façamos da ética uma arma. Na medida do possível, sigamos a paz com todos (Rm 12.18), ou seja, não transformemos a ética em instrumento para bater nos outros.

    • Paul Freston, inglês naturalizado brasileiro, é professor colaborador do programa de pós-graduação em sociologia na Universidade Federal de São Carlos e professor catedrático de religião e política em contexto global na Balsillie School of International Affairs e na Wilfrid Laurier University, em Waterloo, Ontário, Canadá.

    com a colaboração de

    • Raphael Freston é mestrando em sociologia na Universidade de São Paulo.

    http://www.ultimato.com.br/revista/artigos/371/etica-crista-e-secularismo

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