BIOGRAFIA – Huldreich Zwínglio

A Reforma na Suiça

A Suíça era o território mais livre da Europa ao tempo da Reforma, embora integrasse formalmente o Santo Império Romano. Já em 1291, os cantões livres de Schwyz, Uri e Unterwalden formavam uma união federal em que cada um ia se desenvolver livremente como república autogovernada. Por ocasião da Reforma já eram 13 os cantões da confederação.

Por causa de seu sólido espírito democrático, os mercenários suíços eram requisitados em toda a Europa. Foram eles que encheram os exércitos que o papado organizou para defender seus interesses pela força das armas.

Cada cantão tinha todo o encargo dos negócios locais, o seu governo estava livre para aceitar a forma de religião que quisesse. Por isso, a Reforma na Suíça foi acompanhada de dispositivos legais estabelecidos por governos locais democraticamente eleitos.

As cidades suíças eram também centros de cultura e nelas o humanismo se estabeleceu. Basiléia tinha uma universidade de renome; foi lá que o grande Erasmo editou o Novo Testamento Grego. Por causa disso, a Reforma Suíça teve no humanismo uma de suas maiores fontes.

Três tipos da teologia Reformada se desenvolveram nos territórios suíços. Os cantões do norte, de fala alemã, seguiram Zwínglio. Os do sul, liderados por Genebra, seguiram Calvino. E os radicais da Reforma, conhecidos como anabatistas, formaram uma facção extrema daqueles que, antes, tinham trabalhado com Zwínglio. De Zurich, o movimento anabatista alcançou toda a Suíça, a Alemanha e a Holanda, onde, sob a liderança de Menno Simmons, solidificou-se mais.
I. A Reforma de Zwínglio nos Cantões Alemães do Norte da Suíça

Huldreich Zwínglio (1484-1531) pertence também à primeira geração de reformadores. Com ele, as forças descontentes com Roma se uniram para uma reforma da igreja. Seu pai era fazendeiro e juiz de Wildhaus. Tinha, pois, sua família uma renda que lhe permitia receber uma boa educação para o sacerdócio. Depois de freqüentar a Universidade de Viena, foi em 1502 para a Universidade de Basiléia, onde se formou em Bacharel em Artes, em 1504, vindo a receber o grau de mestre dois anos depois. O humanismo dos professores interessara-lhe. Erasmo era o seu ídolo; as ciências humanas, o seu maior interesse. Pouco lhe interessava a teologia.

Entre 1506 e 1518, serviu como pastor em Einsieden, um centro de peregrinos. Aí começou a se opor a alguns abusos como o sistema romano das indulgências e a imagem negra da Virgem Maria, ridicularizando-os à moda de Erasmo. Quando o Novo Testamento grego de Erasmo veio à luz, em 1516, Zwínglio copiou as cartas de Paulo de um exemplar emprestado até ter o seu. Ao deixar Einsieden, ele era um humanista bíblico. Chamado para pastorear em Zurich, começou seu trabalho no começo de 1519. Nessa época, definiu sua posição contra o engajamento de mercenários suíços no serviço estrangeiro, em razão das influências corruptoras que via exercidas sobre os homens alistados neste serviço; Zurich proibiu a prática em 1521.

Uma epidemia de peste bubônica em 1519 e o contato com as idéias luteranas levaram-no a uma experiência de conversão. Zwinglio levantou a primeira bandeira da Reforma quando declarou que os dízimos pagos pelos fiéis não eram exigência divina, sendo, pois, o seu pagamento uma questão de voluntariedade. Isto abalou as bases financeiras do sistema romano. Por essa época, estranhamente, o reformador se casou às escondidas com uma viúva, Anna Reinhard, em 1522. Só em 1524, legitimou ele publicamente esta união ao se casar publicamente.

Quando os cidadãos invalidaram a prática do jejum quaresmal, sua argumentação foi o ensino de Zwinglio sobre a autoridade exclusiva da Bíblia. Como a liturgia romana começava a se alterar com as modificações introduzidas, as autoridades católicas resolveram promoveria um debate público em que Zwinglio sozinho enfrentaria a todos. Depois disso, então, os líderes civis eleitos pelo povo escolheriam a fé que a cidade e o cantão adotariam. Foi por isso que a Reforma nos cantões do norte da Suíça começou por uma iniciativa oficial.

Para o debate, Zwinglio preparou 67 Artigos, onde insistia na salvação pela fé, na autoridade da Bíblia, na supremacia de Cristo na Igreja e no direito dos sacerdotes ao casamento. Condenavam-se, também, as práticas romanas não aprovadas pela Bíblia. O conselho da cidade decidiu-se pela vitória de Zwinglio e suas idéias ganharam logo condição de legalidade. As taxas de batismo e sepultamento foram abolidas; monges e freiras receberam permissão para se casarem; o uso de imagens e relíquias foi proibido. Em 1525 a Reforma se completou em Zurich com a supressão da missa. O ensino de Zwinglio de que a última palavra pertence à comunidade cristã, que exerceria sua ação com base na autoridade da Bíblia frutificou na reforma suíça: nela, igreja e Estado estavam unidos teocraticamente.

Berna foi conquistada para a Reforma através de um debate semelhante ao de Zurich. Zwinglio participou com suas 10 teses, e, como resultado do debate, o conselheiro da cidade decretou em 1528 a aceitação dos princípios da Reforma. Em 1529, a missa foi abolida em Basiléia pela influência de um amigo íntimo de Zwinglio, de nome Ecolampadio.

A partir de 1522, Zwinglio foi estorvado pelos seguidores que se tornaram conhecidos como anabatistas devido à sua insistência no rebatismo dos convertidos. Em 1525, o conselho municipal proibiu seus encontros e os expulsou da cidade. Felix Manz (1498-1527) foi executado por afogamento.

Zwinglio perdeu também o apoio de Lutero no Colóquio de Marburg, em 1529, depois de não concordarem sobre a natureza da presença de Cristo na Ceia. O zwinglianismo prosseguiu, então, separado do luteranismo.

A aceitação dos princípios zwinglianos por vários cantões tornou necessária alguma forma de organização religiosa, e em 1527 um sínodo das igrejas evangélicas reformadas suíças foi formado. Ao mesmo tempo, a Bíblia foi traduzida para a língua do povo. Até essa época o papa não tinha interferido, temeroso de perder os mercenários suíços, mas os velhos cantões rurais, fiéis ao papa, resolveram acabar com o silêncio de Roma. Organizaram uma União Cristã dos Cantões Católicos e, em 1529, uma guerra aberta irrompeu entre cantões protestantes e católicos. Os dois grupos fizeram uma trégua em Cappel, pela qual a maioria dos cidadãos de cada cantão escolheria a sua religião, garantindo a tolerância aos protestantes dos cantões papais. Quando Zwinglio tentou conquistar Genebra para sua causa, uma nova guerra começou, em 1531. Zwinglio juntou-se aos seus soldados como capelão, morrendo em combate. O resultado da batalha foi cada cantão receber o controle total de seus negócios internos, e Zurique ter entrado em aliança com a Liga Cívica Cristã dos Cantões Reformados. Depois disso, houve uma pequena mudança na situação religiosa na suíça alemã. Heinrich Bullinger foi o sucessor competente e conciliador de Zwinglio. Mais tarde, zwinglianos e calvinistas conjugaram seus esforços nas Igrejas Reformadas da Suíça, através do acordo de Zurique, em 1549.

Zwinglio foi o mais humanista dos reformadores. Para ele, gregos como Sócrates e Platão e romanos como Catão, Sêneca e Cipião estavam no céu. Afora isso, sustentou a autoridade absoluta da Bíblia, nada permitindo em religião o que não fosse autorizado pela Bíblia. Aceitou a predestinação incondicional para a salvação, entendendo que somente aqueles que ouvissem e rejeitassem o Evangelho estavam predestinados à condenação. Zwinglio cria que a fé era a parte mais importante dos sacramentos, a Ceia do Senhor era uma “comemoração” e não uma “repetição” da Expiação, pelo que o crente pela reflexão sobre a morte de Cristo recebe bênção espiritual. Ele concebia o pecado original como uma culpa; as crianças poderiam, portanto, ser salvas por Cristo independentemente de batismo. Seu livro, Verdadeira e Falsa Religião, 1525, expressa o seu ponto de vista bíblico e cristocêntrico.

Foram estas as idéias do homem que colocou os fundamentos da fé reformada na Suíça Alemã. Embora Calvino tenha se tornado o herói da fé reformada, a igreja não pode esquecer o papel de Zwinglio, erudito, democrático e sincero, na libertação da Suíça das garras do papa; embora mais liberal que Lutero, foi tão corajoso quanto o grande reformador.

Fonte: O Cristianismo Através dos Séculos – Uma História da Igreja Cristã, Editora Vida Nova, Capítulo 28.

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